terça-feira

Charco

Preferia fugir e ficar até anoitecer deitado na relva. A ter de encarar o fracasso escrito em todas as caras (ou, em maior verdade, em todos os espelhos a olhar fixamente para mim). O ar era quente e saturado, o céu alaranjava conforme a luz caía em raios cujos ângulos pintavam o azul de uma cor diferente. As rãs no charco eram a banda sonora perfeita para o mais barulhento cérebro. O charco quieto o melhor cenário para o mais entorpecido corpo. As linhas rectas desenhadas pelos aviões muitos quilómetros acima do chão contrastavam com as curvas enroladas das tentativas de raciocínio e gozavam com a falta de certeza que dali emanava. Se parte queria levantar-se, erguer-se para tomar uma atitude e decididamente saber para sempre como resolver tudo o que surgisse, a parte maior que essa deixava-se inadvertidamente estar, horizontalmente descontraída, a contrair a outra tanto que não lhe deu espaço nunca para crescer. Guerra desleal. Tomada inconscientemente e de forma tão inevitável.  Se ao menos pudesse querer calar aquelas rãs... Elas talvez deixassem o pensamento ser mais claro, menos difícil. Mais concreto. E determinado. E capaz. Talvez me sentisse melhor.